Mais de três dezenas de cientistas de todo o mundo juntaram-se para analisar os vários impactos da Covid-19 no turismo e perspetivar o futuro desta indústria, num livro que foi editado por um grupo de investigadores da Universidade de Coimbra (UC) e do Instituto Politécnico de Viseu (IPV).
Além de analisar os impactos de pandemias, doenças e surtos de vírus no turismo e na mobilidade em todo o mundo e considerar os novos desafios que a indústria do turismo terá de enfrentar no futuro esta obra, acabada de publicar, foca ainda temas como as estratégias de promoção, recuperação e resiliência em vários países para enfrentar a crise atual.
Cláudia Seabra, docente da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e uma das editoras do livro, refere que “os estudos de caso incluídos neste livro, onde podemos perceber como vários países dos cinco continentes lidaram com a pandemia e os principais efeitos que esta teve na atividade e mercados turísticos, ajuda-nos a perceber os efeitos da Covid-19 de uma forma mais global e comparada e permite-nos aprender com as boas práticas implementadas”.
Nesta obra está incluído um estudo sobre Portugal, realizado pela equipa de Cláudia Seabra, que permitiu “determinar as perceções de risco e segurança dos portugueses no contexto criado pela pandemia Covid-19 e, consequentemente, o seu comportamento de viagem, assim como a sua disponibilidade para aceitar as medidas de segurança e restrições implementadas.”
Para perceber isto a equipa criou um questionário para indivíduos de ambos os sexos, residentes em Portugal e com idade igual ou superior a 18 anos, onde obteve 1902 respostas válidas. Este estudo foi realizado pela equipa ao longo de um ano, de de fevereiro de 2020 a fevereiro de 2021, abrangendo assim as perceções dos portugueses em 4 fases distintas: 1º vaga, verão de 2020, 2ª vaga e 3ª vaga da pandemia.
Os principais resultados do estudo mostram que a pandemia tem um impacto muito expressivo na perceção de segurança que os residentes portugueses associam atualmente às viagens. Mais de 90% dos inquiridos afirmaram que a segurança é um assunto sério em viagens nacionais ou internacionais e que, devido à pandemia, viajar é arriscado.
Segundo o estudo a importância atribuída às questões de segurança foi mais forte durante a 1ª e 3ª vagas, evidenciando que na 2ª vaga os portugueses se preocuparam menos com as questões de segurança. O mesmo padrão foi registado para atividades de lazer e turismo.
De acordo com a investigadora da UC, Cláudia Seabra, um resultado “surpreendente” foi obtido para atividades especificamente ligadas ao turismo ou envolvendo grandes multidões: “Os maiores níveis de insegurança foram observados durante o verão de 2020, quando o país registou menos casos de contágio e mortes. Esse resultado pode ser explicado pela grande procura turística que geralmente existe no nosso país no período de verão. Os residentes achavam que essas atividades poderiam atrair mais pessoas e, portanto, causar maior risco. Por outro lado, atividades que exigiam o uso de espaços fechados, e que atraem mais pessoas no outono e festas, foram consideradas menos seguras durante a 2ª vaga”, esclareceu a investigadora.
O medo de infeção foi maior durante a 1ª vaga, “talvez pelo facto de a doença ser ainda desconhecida. Ao longo do tempo esse medo foi diminuindo. Mas os níveis de nervosismo e insónia causados pela Covid-19 aumentaram novamente durante a 3ª vaga, provavelmente pelo facto de Portugal ser, durante aquele período, o país com maior número de casos de infeção e óbitos por milhão de habitantes em todo o mundo”, comenta Cláudia Seabra.
No que respeita às restrições e medidas de segurança impostas pelo Governo, globalmente, os portugueses concordaram com a maioria delas. Contudo, opõem-se às medidas restritivas relativas à limitação da mobilidade entre países. Os níveis de aceitação mais elevados da maioria das restrições e medidas de segurança foram registados durante a 1ª e 3ª vagas.
No que se refere às perceções de segurança relacionadas com a vida quotidiana e planos futuros, os inquiridos revelaram que irão alterar vários aspetos da sua rotina diária e dos seus planos de férias futuras devido à Covid-19.
Com este estudo, Cláudia Seabra conclui que “com o tempo, os portugueses consideraram as viagens domésticas menos arriscadas, especialmente até à 2º vaga. Além disso, as atividades ao ar livre e realizadas em ambiente natural são claramente as formas de lazer consideradas mais seguras pela população portuguesa. As organizações de turismo devem investir neste tipo de oferta no futuro. O nível mais alto de medo e preocupação é evidenciado pelas gerações mais velhas, portanto, esse segmento de mercado certamente precisará de mais tempo para se sentir seguro o suficiente para viajar novamente”