O Alojamento Local, ou AL para os mais íntimos, está mais na moda do que nunca! Poderia pensar-se que seria pelas suas taxas de ocupação, mas a razão é outra!
Hugo Teixeira Francisco
Num lado, temos os defensores da habitação a clamar pelo fim desta modalidade de alojamento, enquanto, por outro lado, os defensores do setor do turismo gritam com toda a força que “acabar com o Alojamento Local é matar o turismo”. Parece um enredo digno de um romance de Eça de Queiroz, com críticas sociopolíticas e um interesse obsessivo pelos comportamentos coletivos e associativos. Será que o até agora “namoro” entre as grandes cidades e o AL está condenado ao fracasso, ou será que está apenas a passar por uma fase de reinvenção?
Amado por uns, odiado por outros, sem sabermos ao certo quanto são quantos, o alojamento local tem-se tornado num inquilino familiar na reunião de condomínio. Tendo começado numa posição coadjuvante, rapidamente ocupou o lugar de destaque na estória do turismo nacional. Basta consultar o Registo Nacional de Turismo (RNT) para perceber que há 114.864 alojamentos locais (RNAL) contra 5.308 empreendimentos turísticos (RNET), em Portugal, à data de redação deste artigo. É uma verdadeira avalanche de casas disponíveis para alugar!
Na verdade, este tema não é novo, desde a sua criação em 2014 e alteração em 2018, o AL já motivou diversas discussões, principalmente pelo seu impacto económico, turístico e social que tem vindo a provocar. Em 2018, já o Tribunal da Relação se tinha pronunciado no sentido de “determinar que a atividade de alojamento local se enquadrava no conceito de habitação utilizado no título constitutivo da propriedade horizontal, ditando a sua finalidade, e assim unificava a utilização para fim distinto daquele a que era inicialmente destinado.”
Agora que a proposta de lei “Mais Habitação” segue para o Parlamento para a sua discussão e votação, naquele que será um dos maiores desafios de sempre do AL, ponderam-se os prós e contras desta solução de alojamento, que tem crescido exponencialmente e, inequivocamente, mudou a forma como os visitantes permanecem no território. Desde a sua apresentação no passado dia 30 de março de 2023, o programa “Mais Habitação” sofreu diversas alterações, sendo que é certo que as grandes cidades serão o palco principal deste romance, que parece que vai transformar-se rapidamente numa epopeia trágica.
Regressamos ao título desta crónica para perceber o bem e o mal causado pelo alojamento local ao longos dos anos. Por um lado, temos a reabilitação urbana que recuperou e transformou os grandes centros urbanos e permitiu a muitas cidades a sua recuperação, grande parte promovida por privado e sem recursos a financiamentos públicos. Permitiu também um aumento significativo da capacidade de alojamento instalado, principalmente nos grandes centros urbanos, permitindo mais alojamento em sítios onde de outra forma não seriam possíveis unidades. Esta oferta acompanhou também as necessidades do mercado moderno, possibilitando com maior facilidade reservas online, disponibilidades imediatas e soluções de alojamento mais económicas, para quem visita o nosso país. Foi também um importante impulsionador de empregabilidade no setor, criando direta e indiretamente milhares de postos de trabalho e milhões em receita.
Por outro lado, é apontado como um dos principais impulsionadores do êxodo das populações para fora dos grandes centros urbanos, dando origem à gentrificação das cidades e destituindo as mesmas da sua vivência popular. É também um dos principais responsáveis pelo aumento do preço médio da habitação fazendo com que muitos portugueses não tenham capacidade de adquirir casas e deixando o mercado imobiliário à mercê dos investidores internacionais. Ainda recentemente, no programa da TSF “A Vida do Dinheiro”, Nuno Fazenda, Secretário de Estado do Turismo, Comércio e Serviços falava do “equilíbrio necessário entre o alojamento e a população local”. Esse equilíbrio é desejado e fundamental, para evitar que os centro urbanos das grandes cidades portuguesas não sejam mais do que edifícios esvaziados de cultura e vivências. Dessa mesma forma, não me parece de todo razoável que o Governo entenda que tenham de ser os privados, que dentro dos seus direitos constitucionais tomaram as suas decisões de investimento, a ter a responsabilidade de cumprir com as obrigações de habitação sociais.
Já percebemos assim que o tema do alojamento local está longe de ser consensual e, se por um lado, se percebe a necessidade crescente de habitação e a criação de limites dentro dos grandes centros urbanos, por outro lado também questionamos se haverá mais a ganhar ou a perder. A caminhada do AL ainda agora começou e será, certamente, mais um elemento desestabilizador deste governo, sendo certo que os empresários do AL não vão desistir perante mais esta adversidade.
Se há algo que aprendemos durante os anos da covid-19 é que os empresários do turismo vêm criando e cultivando uma enorme resiliência e espírito de solidariedade, e esta será mais uma página do livro que ainda fará correr muita tinta, não estando certo que irá ganhar esta braço de ferro.
Por Hugo Teixeira Francisco
Co-fundador e Chief Marketing Officer da Portugal Green Travel DMC & Consulting, DNA Travel & Events e Foge Comigo por Portugal. Formador na Escola de Hotelaria e Turismo de Coimbra e na Academia Digital do Turismo de Portugal.
Excelente iniciativa, um grande abraço prof…