(Quase) todas as histórias começam por ‘Era uma vez…’
As histórias fazem parte das nossas vidas. Quantos de nós, não têm memórias dos pais ou dos avôs a contar histórias antes de adormecer? Memórias que nos acompanham o resto da vida. Hoje, partilhamos tantas histórias com tantas pessoas e tantos amigos…. Algumas perduram e tantas outras perdem-se no tempo, restando apenas, as histórias comuns para recordar. A técnica de contar histórias, vulgo storytelling tem vindo a ser utilizada pelas marcas para comunicar e envolver os seus públicos, fazendo já parte de muitos cursos de marketing e comunicação. O princípio do storytelling baseia-se na memória e segundo Schank “a memória humana é baseada em histórias”, onde a informação é indexada, armazenada e recuperada sob a forma de histórias que incorporam vários pontos de contato entre as vivências dos ouvintes/espectadores, o que provoca uma consciência implícita e/ou explícita e ligações emocionais às mentes dos ouvintes/espectadores.
O storytelling é uma das várias técnicas usadas pelos marketeers para dar a conhecer ou divulgar um produto. Através das histórias envolvem-se os consumidores, esperando-se a sua satisfação no pós-compra e quiçá, fidelização. Existem vários projetos de sucesso que utilizam o storytelling. O ‘Human Library’ é um desses projetos que vive literalmente de histórias e está ativo em mais de 50 países. Na Dinamarca, existem bibliotecas onde se emprestam pessoas para ouvir as suas histórias de vida, durante 30 minutos, em vez livros. O objetivo é combater os preconceitos. Cada pessoa tem um título – ‘desempregado’, ‘refugiado’, ‘bipolar’, entre outros – mas ao ouvir a sua história, compreendemos que não se deve ‘julgar um livro pela capa’.
Uma das coisas maravilhosas de viajar, é a quantidade de pequenas e de grandes histórias que colecionamos, garantindo que ficam connosco, na nossa memória. E os destinos turísticos estão repletos de exemplos. O pavilhão dos EUA, na Expo Dubai´2020, aproveitou de forma engenhosa a sua experiência de viagens à Lua e presenteou os visitantes com a possibilidade ‘única’ de tocar numa pedra trazida da Lua. Uaaaauuuu! Filas de pessoas para tocar na ‘Lua’ e uma história para contar, no regresso a casa. Outro exemplo é a visita ao berço da Afrodite. Uma rocha no meio do mar do Chipre assinala o local, onde nasceu a Deusa do Amor. A história que se desenrola à volta deste evento é enternecedora e assim, aquela rocha deixa de ser apenas mais uma rocha, no meio do mar e passa a ser a rocha. No mesmo país, Nicósia concentra as suas estórias infantis no Fairy Tale Museum, onde as crianças trespassam as portas do museu e passam a integrar aquele mundo encantado que desarma até os mais cépticos na magia das histórias.
Na hotelaria, escolhi duas marcas para ilustrar a utilização das histórias na (com) provação da sua hospitalidade. A cadeia Shangri-la lançou uma das suas mais icónicas campanhas: ‘To embrace a stranger as one of our own’ criada e desenvolvida pela Ogilvy & Mother. A marca conta a história de um estranho (hóspede) que se perde, no meio da neve, na procura do seu destino (hotel). No caminho vê-se assolado por diversos perigos e obstáculos, nomeadamente, uma alcateia de lobos. Perdido e desorientado perde as forças e deixa-se cair na neve…. nisto, os lobos aproximam-se…. (suspense). No fim, vê-se o estranho a acordar no meio dos lobos que o salvaram de morrer de frio e aparece o slogan, “Abraçamos um estranho como se fosse um dos nossos…. ”. Épica, a forma como a cadeia hoteleira apresenta a sua filosofia. Os hóspedes entram como estranhos e saiem como ‘família’. O que reflecte exactamente o que dizem dois investigadores, Lashley e Morrison sobre hospitalidade “hospitality converts strangers into familiars, enemies into friends, friends into better friends, outsiders into insiders, non-kin into kin”. Ou como refere a Odisseia de Homero: “A guest never forgets the host who had treated him kindly”.
O Hotel Burj al Arab, no Dubai é em sim próprio, uma história. Uma unidade hoteleira que se posiciona como o hotel de 7 estrelas, sabendo que os rankings vão de 1 a 5. Querem dizer de forma subliminar que são tão bons que não cabem dentro da escala. O Burj al Arab tem alimentado sonhos, vende-se como um hotel de luxo, ouvem-se histórias de casamentos feitos num heliporto, e noutra alturas, o mesmo heliporto é palco de um exclusivo jogo de ténis. E é verdade que o hotel usa ouro na sua decoração. O teto da sala de eventos é forrado a folha de ouro e todos os anos (devido à oxidação) uma equipa repõe uma a uma, cada uma destas folhas. Histórias que têm o objetivo de criar word-of-mouth (e-WoM) para o hotel e aumentar a vontade dos turistas para conhecer o Dubai. Quem visita o Emirato quer conhecer o hotel, verificar esta e outras histórias que se contam, entre uns e outros e através de uma boa história ou de uma simples fotografia registar aquele momento para sempre.
Entre pedras, rochas e ouro, esta como outras histórias, termina com:
‘Um final feliz, ou um …E viveram felizes para sempre….!’
Por Sofia Almeida
É professora auxiliar na Universidade Europeia e investigadora no CEG/Territur, Universidade de Lisboa.
salmeida@universidadeeuropeia.pt