Teresa Neves já não faz previsões, vive um dia de cada vez naquele que é um dos setores mais afetados pela pandemia, as agências de viagens. Nos quase 30 anos de experiência como agente de viagens, já passou por muitas crises, “mas nada se compara a esta pandemia” e os números não mentem. Em 2020, a quebra de faturação da agência de viagens temáticas em grupo e viagens à medida Novas Fronteiras, que fundou com mais um sócio há apenas quatro anos, chegou aos 90% e, em 2021, está acima dos 75%. Mesmo para quem está habituada às contrariedades e aos contratempos da profissão, tem sido difícil ultrapassar esta pandemia.
No passado mês de junho, a agência que tem sede em Lisboa realizou a primeira viagem de grupo cultural dos últimos oito meses. O destino foi o Egito, um dos produtos com maior sucesso na oferta da agência. A agência preparou duas saídas com um grupo de 15 pessoas cada: uma de 2 a 13 de junho que já estava programada; e a outra de 13 a 29 de junho. Neste caso, uma viagem que estava programada para a Páscoa de 2020 e que passou para a Páscoa de 2021, e, finalmente, foi feita agora. “Correu lindamente”, afirma Teresa Neves, em entrevista ao TNews. “Temos uma forte experiência no destino e estamos bem apoiados, tanto pelo operador local de excelência, como pelo Professor Doutor Luís Manuel de Araújo, egiptólogo, que ajuda na coordenação das viagens, acompanha e dá apoio científico”, acrescenta.
As diferenças da organização de uma viagem de grupo antes da pandemia para agora não estão na dimensão do grupo, mas na quantidade de procedimentos que são exigidos: “Nestas viagens temáticas, os grupos já são pequenos, de 20 a 25 pessoas no máximo, metade de um autocarro se contabilizarmos. Por isso, nesse aspeto não há grandes diferenças. Em termos de burocracia e procedimentos, mudou radicalmente.” Além de não existirem medidas standards- cada país tem o seu procedimento, o problema está “na mudança radical de uma semana para a outra” e isso, lamenta, “acontece sistematicamente”. O trabalho tornou-se ainda mais exigente. “Temos de estar constantemente informados e há procedimentos que fazemos pelo cliente. É um serviço que estamos a prestar mas que exige tempo, há muitos dados a introduzir por cada companhia aérea, país e é algo que é demorado”.
Contacto com o cliente
Com 90% de quebra de faturação, a agência Novas Fronteiras não teve outra alternativa senão a de recorrer ao lay off e ao apoio à retoma. Foram muitos meses de confinamento, paragem forçada da atividade e, sobretudo, um afastamento do cliente. Para ultrapassar esta contrariedade, a empresa começou a realizar em janeiro webinares semanais sobre destinos. Todos sábados, de janeiro a junho, a Novas Fronteiras apresentou um webinar sobre um país diferente com a participação de operadores estrangeiros e parceiros locais da agência. “Às vezes não eram destinos com os quais tínhamos intenção de fazer viagens em grupo, mas permitiam que o cliente conhecesse o destino e, ao mesmo tempo, mantermos a proximidade às pessoas”, explica Teresa Neves. “Fazemos viagens em grupo e acompanhamos os clientes em viagem, estava a ser muito difícil este distanciamento entre nós e os clientes. Não estou a falar de negócio, estou a falar de estar com as pessoas”. Falaram do Uzbequistão, Irão, Colômbia, Egito, Itália, Grécia, Geórgia, Arménia, Peru, só para referir alguns. Os primeiros webinares foram logo uma surpresa, com 100 pessoas a assistir. “Chegámos a ter 300 pessoas em simultâneo online a assistir aos webinares. Foi muito interessante e resultou muito bem para esta proximidade com as pessoas. Foi o mais importante”, revela.
“Fazemos viagens em grupo e acompanhamos os clientes em viagem, estava a ser muito difícil este distanciamento entre nós e os clientes”
Teresa Neves constata que existem dois grupos de clientes distintos: “Os clientes que querem viajar, independentemente das condições, claro que com todas as normas de segurança; depois há o grupo de pessoas que tem medo de viajar”. As que querem viajar são em maior número, no entanto, “há imensos contratempos e contrariedades que impossibilitam a pessoa de ir para o destino que pretende”, constata. “Há muitos destinos fechados e outros que nem sabemos quando vão abrir, não há informação nenhuma. O obstáculo já não é a pessoa não querer viajar. Isso já acabou. As pessoas querem viajar, mas há procedimentos que prejudicam a viabilidade da viagem”, afirma.
Dia 17 de agosto, a agência volta a realizar duas viagens com dois grupos de 20 pessoas para o Egito. Em setembro está programada uma viagem para Itália, Arménia e Geórgia, com grupos de 15 e 20 pessoas. Em outubro vão à Grécia, e de novo ao Egito. Depois, ainda existem viagens programadas para Itália e República Checa até ao final do ano.
A razão que esteve na origem da abertura da agência Novas Fronteiras foi a criação de viagens temáticas com especialistas. Apesar de ser uma empresa recente, parte da equipa já se conhece e trabalha desde 1995 na área das viagens temáticas culturais.
Em 2019, aumentaram a equipa para seis pessoas. Ao segmento das viagens em grupo temáticas com e sem especialistas, adicionaram as viagens individuais à medida do cliente.
“O nosso cliente é um cliente com um interesse cultural acima da média e com disponibilidade de tempo. Não é um cliente que procura os meses de verão para viajar, é um cliente muito viajado e procura experiências diferentes. A maior parte até repete destinos, mas procura outro itinerário mais pormenorizado, que o leve a conhecer o país de uma outra forma”, explica Teresa Neves.
Este perfil de clientes exige da equipa um conhecimento e um estudo sobre os destinos.
“Não conhecemos o mundo inteiro, mas leva-nos a um estudo enorme sobre o país em questão, desde o clima aos transportes locais terrestres, ferroviários, ligações aéreas”, conclui.
Papel do agente de viagens
Com experiência consolidada na atividade, Teresa Neves não tem dúvidas que o papel do agente de viagens sai reforçado na pandemia. “Não constato isso apenas agora. Estou dentro da profissão há quase 30 anos e sempre constatei isso. Reforçou-se no início da pandemia com a quantidade de repatriamentos e agendamentos que fizemos com o apoio de parceiros e companhias áreas, e, sobretudo, também de companhias de seguros que nos apoiaram em imensas situações de repatriamento. Notou-se isso nitidamente no início da pandemia, as pessoas que estavam sozinhas nos países tinham ido por sua conta. Agora, nesta fase, [o papel do agente de viagens] sai mais reforçado, porque os procedimentos são muitos e, neste momento, é difícil para uma pessoa sozinha programar uma viagem, pelo menos no conceito que nós a fazemos, neste conceito de viagens à medida para destinos menos comuns”.