Quarta-feira, Fevereiro 19, 2025
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Como poderá o ChatGPT mudar o turismo?

O ChatGPT tornou-se um fenómeno viral pela sua capacidade de interagir verbalmente ser similar à de um humano.

Inês Carvalho

Trata-se de um modelo linguístico de grande dimensão acessível através de uma interface que responde às perguntas que lhe coloquemos. É um exemplo de inteligência artificial generativa, i.e., que pode ser utilizada para criar novos conteúdos (ex. imagens, texto, vídeo, código). O excerto abaixo demonstra as suas capacidades linguísticas notáveis, ao pedir-lhe que escrevesse uma quadra sobre o turismo em Portugal:

Devido a estas capacidades, o ChatGPT e modelos similares transformam-se numa ferramenta versátil, estando muitas potencialidades da utilização destes modelos ainda por explorar. Deste modo, torna-se importante conhecer os seus benefícios e limitações para aproveitar ao máximo as potencialidades que oferecem e minimizar os riscos associados.

A utilização mais óbvia do ChatGPT seria enquanto chatbot. Um chatbot é um software que simula um ser humano na conversação respondendo a perguntas. O ChatGPT (ou o modelo que está na sua base, GPT-3.5) poderá ser integrado nos chatbots de empresas para responder às questões dos clientes, auxiliá-los no processo de reserva, confirmar reservas, ou lidar com reclamações. Além disso, o ChatGPT é também uma ferramenta útil para o back-office, onde pode auxiliar em diversas tarefas que impliquem o uso de linguagem. Futuramente, estes modelos linguísticos poderão vir a ser integrados em softwares de revenue management para permitir a extração de informação através da comunicação verbal com o sistema.

Que benefícios é que se pode esperar do ChatGPT? Em primeiro lugar, o ChatGPT e outros modelos similares poderão aumentar a eficiência das operações e melhorar a experiência do consumidor. Os chatbots poderão ganhar maior capacidade de resposta às questões dos clientes e tornar-se mais versáteis. Será possível que estes respondam de forma mais humana e que proporcionem entretenimento – dois aspetos que estudos anteriores sobre chatbots revelaram ser muito valorizados pelos utilizadores. A adição de uma interface de voz ao ChatGPT poderá revolucionar o atendimento ao cliente. Para além disso, estes chatbots poderão proliferar na comunicação interna da empresa para esclarecer dúvidas dos colaboradores sobre políticas da empresa.

As potencialidades destas tecnologias vão, no entanto, muito mais além disto. O ChatGPT pode converter-se num assistente, auxiliando em tarefas como: sumarização de textos (ex. notas de reuniões), redação de instruções, preparação de textos para redes sociais e outros materiais de marketing, ou análise de comentários dos clientes. Poderá auxiliar em tarefas que exigem criatividade, tais como elaborar um menu temático sobre os Lusíadas:

Alguns nomes sugeridos pelo ChatGPT poderão ser pouco sugestivos (por exemplo, “Feijoada de Porco da Ilha dos Amores”); no entanto, serão um ponto de partida para a geração de ideias que poderão ser aprimoradas pelos colaboradores. O aumento da produtividade através do ChatGPT poderá libertar os recursos humanos para novas tarefas, com consequências para a eficiência de um estabelecimento. Para além disso, a interface de fácil utilização do ChatGPT e baixos custos poderão facilitar a sua adoção, mesmo por empresas familiares e de menor dimensão.

Contudo, como diz o ditado, “não há bela sem senão”. Quanto ao uso do ChatGPT enquanto chatbot, não é de descurar o potencial impacto negativo que a substituição de colaboradores humanos por um chatbot pode ter na experiência do consumidor, que poderá sentir o valor social da sua experiência turística diminuir, sentindo-se isolado. Para além disso, enquanto um agente humano, perante uma instrução ambígua, pode colocar uma questão para obter um esclarecimento (ex. “Referiu que pretende viajar com crianças. Qual a idade das crianças?”), o ChatGPT não pede esclarecimentos sobre as instruções que recebe – perdendo-se assim a oportunidade de melhorar a personalização de experiências.

Quanto ao uso do ChatGPT como apoio ao back-office, é de sublinhar que o seu uso sem supervisão e verificação humana pode resultar não só na criação de conteúdo pouco original e desadequado à marca, como também em erros que poderão nalguns casos ser grosseiros. O ChatGPT tem um foco na plausibilidade da resposta e não na veracidade – tendo sido treinado por humanos, busca dar respostas convincentes, que poderão nem sempre ser precisas. Além disso, não raras vezes, o ChatGPT tem “alucinações”, termo que em inteligência artificial designa o fenómeno de a inteligência artificial dar respostas inteiramente confiantes mas que não estão nada de acordo com a verdade. Veja-se abaixo a resposta “alucinada” do ChatGPT:

Deste modo, o ChatGPT não é neste momento a plataforma ideal para apurar factos. É aconselhável que os utilizadores verifiquem a veracidade das respostas dadas pelo modelo antes de as utilizarem, de modo a evitar erros graves que possam causar danos enormes à reputação de uma empresa ou instituição.

Modelos como o ChatGPT aumentarão os riscos de cibersegurança para todos. Será mais fácil gerar informações falsas, spam, emails de phishing, conteúdo malicioso e malware – sendo que o ChatGPT não gera apenas linguagem humana, mas também código informático. Para além disso, dados confidenciais ou informação sensível que sejam partilhados com o ChatGPT poderão ser utilizados para treinar o modelo, cujas respostas poderão passar a replicar dados internos das empresas. Apesar dos riscos que a utilização desta ferramenta pode comportar, a sua não-utilização também implica riscos, nomeadamente o de abdicar de um ganho em eficiência e produtividade, que pode colocar uma empresa em desvantagem em relação à concorrência. Para além disso, o ChatGPT só tem informação sobre o mundo até 2021, pelo que não fornece informação atualizada.

E será que o ChatGPT vai substituir os trabalhadores humanos? Dificilmente o ChatGPT substituirá profissões na área do turismo num futuro próximo. No entanto, por tornar os trabalhadores mais produtivos, poderá ser possível recrutar menos trabalhadores para executar certas funções. Neste contexto, qual seria a prioridade na formação de recursos humanos? Apesar de estarmos ainda num estágio embrionário da utilização destas ferramentas, pelo que o futuro é ainda incerto, diria que é importante preparar para o trabalho híbrido que envolve a colaboração entre humanos e ferramentas que envolvam inteligência artificial, gerar recursos humanos capacitados para avaliar as limitações e riscos da inteligência artificial e valorizar as soft skills.

Este texto baseia-se num artigo conceptual mais lato aceite para publicação numa revista académica: Carvalho, I., & Ivanov, S. (2023). ChatGPT for tourism: applications, benefits, and risks. Tourism Review.

Por: Inês Carvalho

Professora auxiliar na Universidade Europeia e investigadora na Unidade de Investigação em Governança, Competitividade e Políticas Públicas da Universidade de Aveiro (GOVCOPP-UA).

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