O que aconteceria em Portugal, caso as rotas domésticas Lisboa-Faro-Lisboa e Lisboa-Porto-Lisboa fossem proibidas ao abrigo de uma lei semelhante à que foi aprovada no Parlamento Francês, que tem como finalidade reduzir as emissões de carbono do transporte aéreo e incentivar a utilização de outros meios de transporte coletivo? A SkyExpert, uma empresa de consultoria especializada em transporte aéreo, aeroportos e turismo, fez uma previsão.
Recorde-se que o parlamento francês aprovou, em abril de 2021, a proibição de voos domésticos em rotas que podiam ser percorridas por comboio em menos de duas horas e meia. A medida é parte de um projeto de lei climático mais amplo que visa cortar as emissões de carbono de França em 40% em 2030 em relação aos níveis de 1990.
Com esta lei, os voos curtos domésticos entre Paris e Bordéus e Paris e Lyon foram suspensos, em 2021. Na Áustria, a rota Salzburgo-Viena foi igualmente suspensa por razões semelhantes e na Suécia o “flygskam” criou uma forte pressão social para limitar o uso do avião.
A União de Aeroportos da França (UAF) apresentou uma reclamação em Bruxelas contra esta medida, a 17 de setembro de 2021, juntamente com a filial europeia do Conselho Internacional de Aeroportos (ACI Europa).
Fim dos voos domésticos em Portugal
Ambas as rotas são operadas apenas pela TAP, pelo que tal medida não afetaria nenhuma outra companhia aérea, de acordo com a SkyExpert. Estas rotas domésticas, quando conectadas com um voo internacional, geralmente não têm acréscimo de custo no bilhete por relação ao mesmo voo direto para Lisboa, ou seja, são “grátis”. As taxas de ocupação destes voos estão abaixo da média da TAP, “influenciando negativamente outro importante índice de performance da companhia aérea portuguesa”.
Em ambos os casos, a quantidade de passageiros transportados nestas rotas com a intenção de voar entre as duas cidades é “infíma”, defende a empresa de consultoria. No caso de Faro, este valor chega mesmo a ser abaixo dos 10%, os restantes passageiros apenas trocam de avião para outros destinos. Para trocar de avião ou voar diretamente existem várias alternativas.
Outras das implicações desta proibição seria nos aeroportos. No caso de Faro, a operação de Lisboa representa 3% do volume e é a única rota da TAP no Algarve. Para o Porto, que na pré-pandemia via mais de meio milhão de passageiros voar até Lisboa apenas para chegar a outros destinos, esta proibição significaria uma oportunidade de criar novas rotas diretas e fortalecer outras já existentes à partida do Porto.
Para realizar estes voos, a TAP ocupa diversas faixas de aterragem e descolagem, as slots, que escasseiam em qualquer destes aeroportos, em particular em Lisboa. Atualmente, a existência destes voos corresponde a 12 pares de slots, “demasiado para um aeroporto que se diz lotado, e cuja falta de slots impede de crescer para outros destinos”, afirma a SkyExpert.
Outro resultado desta lei em Portugal seria o aumento da aposta em rotas transversais que não passem por Lisboa, como as de Porto-Faro ou Faro-Ponta Delgada, para permitir novas conectividades usando aeroportos portugueses, mas evitando a infraestrutura lisboeta.
Para Pedro Castro, diretor da SkyExpert, não existe vontade política suficiente e existe um enorme conflito de interesses do Governo para se poder avançar com este tipo de medidas. “Penso que isto apenas acontecerá quando Bruxelas aprovar uma diretiva nesse sentido”, remata.