Na abertura da conferência Talent Connect, o primeiro painel dedicado ao tema “O Turismo como Grande Empregador” trouxe à tona reflexões sobre os desafios e oportunidades do setor. Os oradores Antónia Correia, Cristina Nogueira da Fonseca e Leonardo Simões partilharam ideias que revelam a complexidade do turismo enquanto motor de emprego em Portugal.
Antónia Correia, presidente da direção do KIPt e professora da Faculdade de Economia da Universidade do Algarve, destacou a importância da investigação na valorização do turismo. Antónia Correia começou por dizer que é crucial abordar os problemas estruturais que afetam o setor. “Estamos a fazer um trabalho sobre as remunerações… se calhar não é assim tão verdade que se paga mal no turismo,” afirmou, referindo-se ao estigma que muitas vezes envolve os salários na indústria.
Além disso, a responsável mencionou projetos do KIPt em curso, como um estudo sobre as expectativas e ambições dos imigrantes que vêm para Portugal trabalhar no turismo e uma análise às remunerações. “O KIPt é um laboratório colaborativo, para quem não está tão familiarizado, é uma estrutura que faz investigação aplicada, na realidade nós fazemos as duas coisas, fazemos investigação aplicada e investigação pura, publicamos os artigos nas revistas e depois traduzimos para que eles tenham impacto no setor”, explicou. “Estamos a fazer um trabalho sobre as motivações de estudar turismo e de ter uma profissão em turismo,” disse, reforçando que a investigação aplicada pode gerar conclusões úteis para as empresas. “É isso que nós estamos a fazer. Remar contra a maré, continuar a trabalhar para que a excelência pela qual temos vindo a ser premiados continue a existir no nosso turismo.”
Cristina Nogueira da Fonseca, consultora de experiência do funcionário e parceiro da Happytown Portugal, desafiou a narrativa de que o turismo paga mal. “A questão do ordenado só tem, de facto, um grande peso a partir do momento em que… eu não tenho dinheiro para viver com dignidade.” A responsável sublinhou que, embora o salário seja fundamental, a felicidade no trabalho envolve também o bem-estar emocional e mental dos colaboradores. Cristina partilhou dados alarmantes sobre o aumento do consumo de antidepressivos em Portugal, ressaltando a importância de políticas organizacionais que priorizem a saúde mental: “Há, sem dúvida, políticas, estratégias, metodologias, mas nada disso resulta se as pessoas não estiverem bem. E apesar da felicidade ser a algo individual, compete sem dúvida nenhuma às organizações criarem condições para que as pessoas possam florescer e se sintam lá bem. Esta é para mim a primeira missão, olharmos para as nossas pessoas.”
Por sua vez, Leonardo Simões, especialista em aquisição de talentos no Vila Vita Parc e presidente da ADHP Júnior, abordou a perspectiva dos jovens no mercado de trabalho. Elogiou a iniciativa do Talent Connect, sublinhando a necessidade de criar hubs que discutam questões prementes: “Precisamos de mais hubs destes para podermos vir para aqui todos discutir estes temas tão importantes.” Leonardo Simões destacou a importância de desenvolver as soft skills dos jovens, que muitas vezes chegam ao mercado de trabalho sem a preparação necessária. “Estamos a viver um momento em que os jovens são bombardeados com oportunidades de educação, desde cursos profissionais a mestrados e doutoramentos. No entanto, ao chegarem ao mercado de trabalho, muitos não conseguem aplicar o que aprenderam. Essa desconexão é um verdadeiro obstáculo para a indústria”.
Apesar de chegarem com um vasto conhecimento técnico, o setor do turismo é, essencialmente, uma indústria centrada nas pessoas, sublinhou Leonardo Simões, defendendo as soft skills como fundamentais, especialmente em momentos desafiadores e em serviços que exigem interações prolongadas.
“O grande desafio que enfrentamos é que a indústria nunca teve tantos recursos qualificados à disposição. Contudo, ainda há uma significativa percentagem de profissionais sem formação adequada. Além disso, muitos que se formam acabam por não seguir a carreira na área em que se prepararam, resultando na perda de talentos valiosos. Precisamos urgentemente abordar como as empresas estão se preparando para formar esses jovens, especialmente em termos de soft skills. A inteligência emocional e a capacidade de manter um sorriso, mesmo nos dias difíceis, são essenciais na hospitalidade. É isso que devemos gerir e cultivar, pois em termos de hard skills, eles já estão mais do que prontos”, concluiu.
Valorização das profissões
Antónia Correia trouxe à tona uma questão importante: muitos estudantes de hotelaria não veem este setor como uma indústra que oferece uma riqueza cultural única.
“A verdade é que a maior parte dos grupos hoteleiros têm operações fora de Portugal. Por que não concretizar o sonho destes jovens e permitir que tenham experiências além do seu habitat? Isso faria todo sentido, pois é precisamente o que eles procuram. No entanto, precisamos enfrentar os problemas estruturais do setor, que muitas vezes são ignorados”, afirmou.
A responsável destacou que “quando se fala de turismo, fala-se de servir as pessoas. E o servir as pessoas é visto como uma tarefa menos relevante e socialmente menos aceita do que as outras.”
Essa confusão entre serviço e humildade deve ser desfeita. “Se eu lançar a pergunta ao público que está aqui, quantos dos vossos filhos estão a trabalhar em turismo? De que forma é que vocês os influenciaram para terem uma daquelas profissões que nós consideramos como nobres no país?” Precisamos dignificar as profissões no turismo. É crucial mostrar que “servir é uma arte e é algo extremamente digno e culturalmente muito rico.”
“Se não mudarmos essa percepção, continuaremos a influenciar nossos filhos a seguir profissões que consideramos mais ‘nobres’, mas que, paradoxalmente, podem não ter emprego”, disse a responsável. Antónia Correia destacou que “temos que mostrar e temos que conseguir convencer os pais das novas gerações… que servir é uma arte, não é uma tarefa de menos importância.”
“Atualmente, estamos a enfrentar uma diminuição significativa de alunos em turismo, cerca de 15%, o que é preocupante. Essa desmobilização na atração para a profissão é evidente, e embora a contratação de imigrantes ajude a resolver o problema, precisamos de pessoas que conheçam a nossa cultura para representar o nosso país. Sem isso, corremos o risco de perder a autenticidade que valorizamos tanto”, defendeu.
“Nada resulta se as pessoas não estiverem bem; precisamos de olhar para os nossos colaboradores”
Esta deveria ser a visão, o foco, de todos os patrões portugueses, a qual é de facto dos verdadeiros empresários que escasseiam em Portugal.
Exerci diversas funções de gestão, executivo e CEO, sempre defendi esse foco, mas os patrões portugueses precisam de ser enquadrados numa verdadeira estratégia de gestão. Sem um planeamento, sério e transversal, onde as Universidades estejam a par com os desígnios governamentais, os anos irão passando e Portugal sem a revolução que se impõe na gestão empresarial e na coisa pública, os mídia têm culpas no cartório…….