Quarta-feira, Outubro 16, 2024
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Há história no Olissippo Lapa Palace Hotel | Por Jorge Mangorrinha

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Por entre as artes que dançam pelo tempo

Por Jorge Mangorrinha

O Olissipo Lapa Palace é um oásis na cidade de Lisboa. Construído no século XIX, este luxuoso edifício está situado no topo de uma colina com vista para o rio Tejo e apresenta aos hóspedes uma estada inesquecível na capital portuguesa. Situado no bairro diplomático da cidade e integrando um jardim subtropical, foi convertido no Hotel da Lapa, em 1992, segundo um plano de negócio da família Simões de Almeida. Durante o processo de renovação, muitos artistas trabalharam, com dedicação, para manterem os traços e as ambiências originais. Atualmente, sob a gestão do grupo Olissippo, continua a ser uma referência de um luxo assente na personalização. Em 2012, leitores da revista norte-americana Travel & Leisure escolheram-no como o melhor hotel citadino do mundo e muitas mais são as referências em relação ao seu serviço de excelência. Preserva o “glamour” de outrora, quando, pelos grandiosos salões, passou a nata da sociedade lisboeta em bailes épicos. Nestes novos tempos, como hotel, conta com uma lista impressionante de clientes famosos de todo o mundo.

“Bem-vindo a Lisboa!” foi a mensagem manuscrita pelo diretor geral do hotel no cartão com votos de que eu encontrasse tudo o “mais ideal do que é, tal como é”. No quarto 504 de decoração neoclássica, que me coube, e nos quartos contíguos deste quinto piso – o mais nobre –, passaram as mais famosas figuras internacionais que escolheram este hotel para pernoitar, pelo que a responsável pelo conforto e pela limpeza daquele piso, Irene Lopes, ficou admirada por ouvir falar português naquele preciso quarto: “Não é comum, mas é muito bom ouvir!”, exclamou a funcionária que há muitos anos é colaboradora do hotel e que também expressou o seu agrado por se cruzar durante todos esses anos com gente famosa. A lista é extensa, que se confirma pela leitura dos Livros de Ouro que me foram disponibilizados pelo “concierge” Hugo Pereira, num gesto de profunda confiança e amabilidade. Foram simpáticos os minutos de conversa entre ambos, também na presença de Filipe Silva e de Dinis Martins, aliás, imediatamente antes de este prestimoso responsável pela receção me propiciar uma visita guiada ao hotel até ao miradouro do quarto da torre.

A leitura dos Livros de Ouro torna-se impressionante e não esgota o leque de personalidades famosas que estiveram neste hotel, mas este é um repositório de enorme valia. Desde reis e rainhas, presidentes de diferentes Estados, altos dignatários, escritores, desportistas e os mais famosos artistas do mundo, a lista é absolutamente esmagadora, com assinaturas, dedicatórias e desenhos: “pour l’Hotel da Lapa avec mon meilleur souvenir”, escreveu Morris, o belga inventor do Lucky Luke, que o desenhou no livro; “Mon papa est très heureux du séjour qu’il a passé à l’hotel da Lapa”, escreveu o francês Uderzo, desenhando a figura de Astérix; “En souvenir d’un merveilleux weekend”, pelo estilista francês Jean-Paul Gauthier, que também acompanhou o escrito por um desenho; ou o artista português Júlio Pomar, que simplesmente se caricaturou a entrar no hotel, tal como Herman José, pelo traço de um cantor soltando um “I love Hotel da Lapa”. E houve aqueles hóspedes que estiveram uma primeira vez e voltaram, como a atriz brasileira Betty Faria: “Aos amigos do Hotel da Lapa muito obrigado e sorte!”, escreveu na sua primeira estada a 24 de novembro de 1993 para voltar a 21 de fevereiro de 2023, desejando de novo sorte ao hotel.

A sorte terá sido acompanhada de bom serviço, durante estes anos de funcionamento, a fazer fé nos muitos gestos de carinho expressos nos livros, por exemplo por parte de cantores e atores de fama internacional que, desde a década de 1990, puderam apreciar este ícone da hotelaria, talvez merecendo que os seus nomes saltem dos livros para os espaços, numa aposta de promoção diferente em função deste capital que o hotel tem vindo a receber.

O rol de reconhecimentos é soberbo, desde logo a cantora jamaico-norte-americana Grace Jones, que escreveu: “The most beautiful suite I’ve ever slept in” (16-11-1995), ou a cantora norte-americana Cher: “I a lovely Hotel in a beautiful country” (14-12-1995). E ainda: Tina Turner (23-9-1996), Maria Bethânia (12-8-1997), Supertramp (21-4-2002), Simply Red (31-3-2003), Robbie Williams (21-10-2003), Jamie Cullum (23-4-2004), U2 (30-4-2004), Elvis Costello (9-5-2004), Paul McCartney e Heather Mills (29-5-2004), Sting (7-6-2004 e 30-6-2012), Linkin Park (10-6-2004), Metallica (6-6-2004), The Corrs (18-11-2004), R.E.M. (1-2005), Seal (25-4-2005), Il Divo (6-6-2005), Brian May (Queen) (4-7-2005 e 2016), Joaquín Cortez (30-10-2005), James Galway (5-5-2006), Tool (5-2006), Anastacia (6-6-2006), John Malkovitch (28-10-2006), Robert de Niro (6-8-2007), Bob Geldof (14-9-2007), The Police (9-2007), Bon Jovi (1-6-2008), Alejandro Sanz (1-6-2008), Rage Against the Machine (11-7-2018), Duran Duran (12-7-2008), Lou Reed (20-7-2008), AC/DC (5-6-2009), Muse (s/d), Barbra Streisand (2-11-2010), Roger Waters (22-3-2011), Michael Bolton (10-7-2011), Bruce Springsteen (3-6-2012 e 2-6-2014), Randy Newman (5-2013), John Corbett e Bo Derek (20-1-2016), Pearl Jam (15-7-2018), Bryan Adams (7-12-2019), Liam Gallagher (19-6-2022), Mike Love (Beach Boys) (5-7-2022) e Van Morrison (2-2-2023).

O príncipe Carlos (atual rei Carlos III de Inglaterra) pernoitou no hotel a 28 de março de 2011 com a duquesa Camilla Parker-Bowles, atual rainha consorte, reservando três quartos, entre os quais o que me coube. Na sua visita a Portugal, que durou dois dias, estabeleceram-se relações comerciais, sendo que as energias renováveis e o mar foram temas em destaque na agenda.

Neste hotel, há 109 quartos distribuídos por três alas – “Palácio”, “Jardim” e “Villa”. Além do piso nobre do edifício do Palácio, onde também se encontra o antigo salão de baile com murais e vitrais da autoria do pintor Columbano Bordalo Pinheiro, um dos quartos mais emblemáticos é o da Torre, no sétimo piso, um miradouro sobre o Tejo e a Baixa da cidade. Este miradouro não existia, em 1870, quando o visconde de Porto Covo construiu esta casa senhorial na Lapa. Foi criado pelo proprietário seguinte, o conde de Valenças, para que, logo de manhã, pudesse apreciar as vistas. O conde, Luís Leite Pereira Jardim, nasceu, em Coimbra, em 1844, e concluiu a licenciatura em Direito. Em 1877, mudou-se para Lisboa e foi eleito para o executivo da Câmara Municipal, escolhido para seu vice-presidente, cabendo-lhe o pelouro da Instrução. Dez anos depois, iniciou a transformação da casa, incluindo um jardim na grande área verde das traseiras com vista para o Tejo.

Alguns dos artistas que participaram na decoração foram Rafael Bordalo Pinheiro, desenhando e selecionando objetos, e o seu irmão Columbano, que, por exemplo, pintou o teto do salão de baile sob o tema “Dançando pelo tempo” e, ainda, o antigo “boudoir” das senhoras e sala de jantar (atual suíte Conde de Valenças).

Até 1988, o edifício continuou como casa de família, altura em que os herdeiros do conde o venderam à família Simões de Almeida, que o transformou num hotel, então designado Hotel da Lapa. O arquiteto responsável pela reconstrução foi Alberto Cruz, com o seu filho Manuel Cruz, também arquiteto, enquanto o jardim, com piscina, foi redesenhado pelo arquiteto paisagista Francisco Caldeira Cabral. Durante a obra, foi encontrado um aqueduto, hoje considerado património histórico. A antiga sala de armas, hoje Sala Belém, ainda conserva o estilo original. Os vitrais das salas Columbano e Eça de Queirós são originais, bem como os móveis desta última sala, incluindo uma alcatifa secular.

O hotel manteve-se na posse da família Simões de Almeida até 1998, quando a Orient-Express Hotels o adquiriu, depois inaugurando a nova ala da “Villa”, em 2002, com duas suítes e 12 quartos com terraço e vista para o jardim. No “Palácio”, todos os 21 quartos e a suíte Conde de Valenças foram redecorados, em 2003, com móveis construídos em Paços de Ferreira, em diferentes estilos, e com peças de porcelana da Vista Alegre. A decoração tradicional e o design elegante fazem de cada um dos quartos um refúgio temático, desde o estilo D. João V aos estilos Art Déco, Oriental e Colonial e ao regionalismo algarvio. Em 2009, o hotel passou para as mãos do grupo português Olissippo Hotels.

O Olissippo Lapa Palace é um hotel de 5 estrelas que oferece, além do alojamento, o Restaurante Lapa, de cozinha mediterrânica, o Restaurante Le Pavillon, casual junto à piscina exterior e que serve sanduíches, saladas e frutos do mar num pavilhão ao ar livre, e o piano bar Rio Tejo, localizado numa “bow-window” com muita luz e música ao vivo, oferecendo o chá das cinco ou uma refeição mais leve.

Por falar em refeição, a não perder os dois pratos cozinhados a baixa temperatura que experienciei por cortesia da direção do hotel: pargo rosa, com sucos de lingueirão, batata-doce braseada e molho de Bulhão Pato, e o leitão confitado, com aro de batata e puré de cenoura, rebentos de legumes baby. Antes, foi reconfortante a salada de beterraba marinada com maracujá; a finalizar, um crème Brûlée de gengibre de pera confitada em caramelo de especiarias e telha crocante de Pain d’Êpice com gelado de mel. A experiência foi acompanhada pela simpatia de Augusto Ferreira, que serviu estas iguarias preparadas pelo “chef” Hélder Santos, sob um céu do teto pintado por Columbano.

Foi sob o mesmo teto que, a 29 de janeiro de 1995, o pintor Manuel Cargaleiro almoçou e deixou um registo no Livro de Ouro: “É sempre um prazer voltar ao Hotel da Lapa para ver Lisboa e com os amigos aproveitar o requinte do seu Restaurante”.

Os atos de se ficar alojado e de se degustar os pratos deliciosos podem ser acompanhados pelo agendamento de reuniões numa das sete salas existentes para o efeito: Sala Lapa (até 200 pessoas), Sala Estrela (70), Sala Columbano (34-50), Sala Luís XV (20) Sala Belém (20), Sala Monsanto (100) e Auditório Alfama (120). Por entre as artes que dançam pelo tempo.

Além da arte oitocentista original, sobressaem os quadros de John O’Connor, pintor britânico que estudou na Chelsea School of Art e na Slade School em Londres antes de se tornar professor de Perspectiva em várias faculdades de arte de prestígio no Reino Unido. As vistas aguareladas de Lisboa transportam-nos para o Rossio, a Basílica da Estrela, o Carmo, o Castelo de São Jorge ou o Mosteiro dos Jerónimos em Belém, por exemplo, e sempre com a luz que faz da capital portuguesa um lugar único.

A atenção dedicada pelo mais antigo funcionário, o trintanário Pedro Lagarto, e pelo bagageiro Lerner Tavares, impecavelmente fardados, foi reconhecida por mim, à saída, com uma fotografia de ambos, que registei como memória. Acho que os seus sorrisos expressam bem a simpatia de toda a equipa do Olissippo Lapa Palace Hotel. O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso, existem momentos e experiência de vida inesquecíveis e pessoas e lugares incomparáveis.

Clique na galeria para ver imagens do Olissippo Lapa Palace Hotel

*Jorge Mangorrinha é pós-doutorado em Turismo, doutorado em Urbanismo, mestre em História Regional e Local (especialização em Património) e licenciado em Arquitetura. Autor multifacetado recebeu o Prémio José de Figueiredo 2010 da Academia Nacional de Belas-Artes. Com experiência no planeamento turístico, em Portugal e no estrangeiro, exerceu, também, como gestor técnico na Parque Expo’98 e como presidente da Comissão Nacional do Centenário do Turismo em Portugal (1911-2011). Colabora com o TNews, tendo sido o autor da rubrica “A Biblioteca de Jorge Mangorrinha”, a que se segue “Há História no Hotel” durante 12 crónicas.

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