Marisa Brandão é uma jovem de 20 anos, natural da Amadora, em Lisboa. No secundário decidiu ingressar no curso de Turismo da EPHTL (Escola Profissional de Hotelaria e Turismo de Lisboa), onde teve a sua primeira experiência de trabalho internacional, no Ida-Maria Bed & Breakfast, na Finlândia. Mais tarde, licenciou-se em Gestão Hoteleira na Universidade Europeia de Lisboa e fez Erasmus em Valência. Mas, com apenas 20 anos, a sua experiência de trabalho fora do país não se fica por aqui. Está a estagiar, desde março deste ano, na receção do HL Suite Hotel Playa del Ingles, em Las Palmas, nas Canárias.
“A escolha da área do turismo para o meu futuro profissional, trata-se da combinação entre o gosto pela comunicação e informação, e o gosto de viajar e vivenciar experiências”, afirma Marisa Brandão.
No segundo ano do curso na EPHTL, que corresponde ao 11º ano, fez dois estágios. O primeiro, que teve a duração de um mês, foi no hotel Lisbon Arsenal Suites, e serviu de preparação para a sua primeira experiência profissional no estrangeiro, que decorreu na Finlândia, onde estagiou durante três meses no Ida-Maria Old Town Bed & Breakfast, na cidade de Porvoo, que fica a cerca de uma hora de Helsínquia. “Esse Bed & Breakfast foi a experiência que me deu mais interesse na hotelaria. Fiz de tudo um pouco, trabalhei na receção, F&B, housekeeping, ganhei uma enorme experiência de trabalho em todas as áreas”, explica.
No 12º ano, no último ano do curso profissional, fez outro estágio, desta vez numa aérea fora da hotelaria, na agência de viagens Viajes El Corte Inglés. “Como estava no curso de turismo, e não de hotelaria, foram-me propostas duas opções: ou estagiar nas Viajes El Corte Inglés, ou numa empresa que tratava de vistos e passaportes. Eu escolhi as Viajes El Corte Inglés porque sempre gostei da parte da organização de viagens”, conta. Marisa Brandão trabalhava diretamente com o BPI e estava encarregue da coordenação de viagens dos seus colaboradores. “Chama-se outland, o departamento empresarial de viagens da agência, em que trabalhava diretamente com o BPI e organizava as viagens empresariais”, a jovem sublinha que com essa experiência ganhou mais bagagem em relação à organização de viagens, porque além de contactar diretamente com os clientes, tinha contacto direto com o departamento de reservas dos hotéis.
“O que mais me preenche enquanto pessoa é conhecer um lugar, cultura e pessoas novas”
Erasmus em Valência e estágio em Las Palmas, nas Canárias
Quando ingressou na Universidade Europeia, no curso de Gestão Hoteleira, já sabia que queria fazer Erasmus, mas só surgiu essa oportunidade no último ano da licenciatura. No primeiro semestre do terceiro ano foi de Erasmus, durante seis meses, para a Universidade Europeia de Valência, de setembro de 2021 até fevereiro de 2022, onde estudou Gestão Turística e de Alojamentos. “Escolhi esse destino porque queria melhorar o espanhol, mas as aulas eram todas em inglês, o que deu para melhorar bastante a língua, mas não quis parar por aí. Como tinha de estagiar no segundo semestre, pensei: porque não continuar em Espanha? Apesar de na cidade de Valência ter aprendido algum espanhol de rua, continuava a querer melhorar a língua em contexto de trabalho”, recorda.
Foram-lhe propostas várias opções, mas quando viu o destino Canárias não conseguiu “dizer que não”. Em maio de 2022 partiu para Las Palmas, nas ilhas Canárias, e foi estagiar para o HL Suite Hotel Playa del Ingles, um hotel de 4 estrelas que pertence ao grupo Hoteles López. “O que mais me preenche enquanto pessoa é conhecer um lugar, cultura e pessoas novas, e saber que através da comunicação e informação adequada posso auxiliar nesse processo e fazer a diferença na experiência de um turista”, explica.
Está atualmente a estagiar no departamento de receção, onde desempenha várias funções, “desde receção de clientes, a check-ins e check-outs, faturação, organização de documentos, inserção de dados em folhas de excel, até análises de estatísticas”. Marisa Brandão explica que o hotel está inserido num grupo antigo e que precisava de inovar em algumas áreas, por isso, ajudou-os a “dar um ‘refresh’ ao departamento”. A jovem embarcou nesta aventura com outra colega que a acompanha desde a universidade Europeia, Madalena Simões, de 22 anos. Juntas, tentaram criar mais dinâmica no departamento onde estão a estagiar. “Aos poucos, fomos alterando alguns ficheiros de informações ao cliente que estavam desatualizados, como o plano de animação turística. Através de programas de design, como o Canva, conseguimos melhorar a estética do hotel. Também criámos de raiz documentos de informação, como informações relativas a transporte e um documento com recomendações de restaurantes, que não existiam anteriormente”, conta.


“O staff é maravilhoso, trabalho com uma equipa que me trata como se fosse funcionária do hotel, e não como estagiária.”
Quando chegou ao destino, foi “muito bem recebida”, tanto pelos colegas de trabalho como pelos supervisores. O hotel providencia, além da remuneração, alojamento, alimentação e passe de transporte. Está a viver a cerca de 30 minutos de autocarro do hotel e partilha o alojamento com a sua colega da Universidade Europeia, com outra funcionária portuguesa natural do Porto e com uma mexicana. “O staff é maravilhoso, trabalho com uma equipa que me trata como se fosse funcionária do hotel, e não como estagiária. Prestaram-me sempre todo o auxílio necessário e ensinaram-me sempre tudo, nunca deixando de parte alguma explicação só por ser estagiária”, refere.
Marisa Brandão trabalha oito horas por dia, cinco dias por semana e “as condições de trabalho são ótimas. Além da pausa de uma hora, quando há menos fluxo de trabalho deixam-se sempre descansar um bocadinho. Além disso, a comida é bastante boa e o alojamento tem boas condições”, menciona.
No mercado de trabalho em Portugal existe “uma postura mais rigorosa”
Apesar de ter referido que os ordenados não são perfeitos, defendeu que “são melhores do que em Portugal”, que no país onde nasceu “de certeza que não estava a ser remunerada por um estágio”.
“Em Portugal o mercado é injusto com os estagiários, porque não lhes dão tanto valor”. No hotel onde está a estagiar é permitido ter o cabelo solto, e não a obrigam a tirar o piercing da orelha. Em Portugal, pelo contrário, “existe uma postura mais rigorosa, temos de estar sempre em pé, com o cabelo apanhado. Aqui, posso dar de mim de uma forma que em Portugal não podia, porque não me deixavam, tinha sempre a restrição do: Será que posso dizer isto? Será que posso fazer aquilo? Aqui, sinto-me muito mais à vontade e posso prestar um serviço mais personalizado. Em Portugal é mais difícil, porque temos sempre olhos em cima que não nos deixam ser nós próprios”, sublinha.
O estágio no HL Suite Hotel Playa del Ingles termina em agosto, e no futuro imagina-se mais a trabalhar no estrangeiro do que em Portugal. Está a pensar em Malta e Itália, porque apesar de adorar Portugal considera que é um sítio para passar férias, “não para viver e trabalhar”.
“Nunca me aconteceu, mas sei de pessoas em Portugal que não tiveram tempo para comer ou para fazer uma pausa durante o horário de trabalho, e que trabalham horas extraordinárias mas não são valorizadas por isso.”
“A hotelaria e o turismo são uma área em que é necessário darmos muito de nós mesmos e em que trabalhamos muitas horas. Ao estarmos constantemente em contacto com clientes, a desenvolver experiências, e a prestar o melhor serviço para os hóspedes, temos de estar bem. Mas se não tivermos as condições de trabalho necessárias, e não me refiro só à remuneração, torna-se mais difícil desempenhar esse trabalho. Nunca me aconteceu, mas sei de pessoas em Portugal que não tiveram tempo para comer ou para fazer uma pausa durante o horário de trabalho, e que trabalham horas extraordinárias mas não são valorizadas por isso”, menciona.
“Em Portugal há falta de incentivo, não me refiro só à remuneração, muitas vezes existe uma falta de valorização dos postos de trabalho. Além de pagarem mal, não sabem dar valor aos profissionais que têm e, nesse sentido, perdem em relação ao estrangeiro, porque os portugueses no estrangeiro são bastante valorizados e vistos com bons olhos”, complementa.
Vantagens e desvantagens de trabalhar longe de casa
O que a jovem portuguesa mais valoriza neste estágio no exterior é, além da experiência de trabalho, o contacto com uma grande diversidade de culturas. Marisa Brandão vive num prédio juntamente com outros estagiários do hotel, por isso vive com pessoas de diversas nacionalidades, como pessoas provenientes da Colômbia, Rússia ou Polónia. “A diversidade de culturas é tão grande que, mesmo que não tenha estado nesses países, sinto que já os conheço”.
“Em Portugal há falta de incentivo, não me refiro só à remuneração, muitas vezes existe uma falta de valorização dos postos de trabalho”.
Além disso, valoriza também a possibilidade de viajar e de conhecer sítios que nunca pensou vir a conhecer. “Eu adoro Portugal, mas sinto falta de algo que me complete e aqui encontrei algumas coisas que me completam. O contacto com outras pessoas, com outros métodos de trabalho e com profissionais que me valorizam é o que mais me enriqueceu nesta experiência”, explica.
Apesar de Marisa Brandão afirmar que o tipo de serviço nas Canárias é muito semelhante a Portugal, a maioria dos hóspedes vem do Reino Unido e da Alemanha. “Os clientes alemães são muito mais rigorosos, exigentes, e resistentes a tentar entender outras línguas. Neste momento estou a aprender alemão e já sei algumas expressões e palavras, mas quando o cliente não é muito aberto torna-se difícil comunicar, e essa é uma das maiores dificuldade que encontrei aqui”, contou.
Porém, as saudades de casa são a maior desvantagem, o que, segundo Marisa Brandão, também tem uma vertente positiva, porque ao embarcar nesta aventura saiu da sua zona de conforto. “Eu sou muito apegada à minha família, mas como vim para o estrangeiro dou mais valor ao que tenho em casa. Quando volto a Portugal é sempre uma sensação indescritível. Quando vou para fora, sabe sempre melhor voltar, é sempre mais intenso”, conclui.