De todos os dossiers, o da privatização da TAP foi aquele que sofreu o maior retrocesso. E sobre o seu futuro pairam enormes incertezas. O decreto anteriormente aprovado pelo governo e vetado pelo Presidente da República não servirá sequer como fonte de inspiração. E agora?
Por Pedro Castro
Teremos de esperar alguns meses após as eleições para conhecer a letra vinculativa do novo diploma de privatização da TAP – se existir e caso seja considerado como prioridade. Pelas diversas declarações e correções públicas a este respeito, já sabemos que esta privatização é puramente ideológica e que não decorre de uma imposição do plano de reestruturação da companhia. A ser novamente elaborado, será que o próximo diploma limitará os potenciais interessados a apenas três grupos aeronáuticos? Será que vai impor um modelo de negócio aeronáutico específico – o do “hub” – ou será que vai privilegiar a garantia da conetividade aérea de Portugal, independentemente do modelo de negócio adotado? E, por fim, qual a posição accionista do Estado na futura TAP? É aí que entra novamente a intervenção política, aquela que nunca abandona da TAP porque a empresa dá “envelopes” e cargos a “influencers”. Enquanto estes e outros pontos não estiverem esclarecidos, os ditos “potenciais interessados” continuarão a dizer, de forma muito desvinculada, que estão na corrida…qual seria a vantagem em declarar o contrário? No entanto, qualquer investidor estrangeiro é obrigado a justificar as suas decisões e os riscos dos negócios que propõe perante acionistas ávidos de obter dividendos altos e margens de lucro satisfatórias. Num passado recente, estes mesmos potenciais interessados desistiram da compra da Alitalia quando o Estado Italiano manifestou a sua vontade de manter uma participação maioritária na companhia. Assim sendo, e em termos políticos, antevejo dois cenários possíveis: ou teremos um governo que abdica da participação do Estado na TAP, vendendo 100% da companhia e com isso existe a hipótese de a TAP integrar um dos três grupos aeronáuticos europeus; ou teremos um governo que valoriza a intervenção do Estado na TAP e, para isso, abrirá o leque de potenciais interessados de forma a incluir outro tipo de investidores – nacionais ou internacionais – que consigam “aguentar” o parceiro Estado.
No cenário externo, a situação é igualmente caótica: a aquisição da Air Europa – com base em Madrid – pelo grupo IAG está pendente da aprovação da Comissão Europeia pela segunda vez. A aquisição de 41% da italiana ITA Airways pela Lufthansa encontra resistência por parte da França, descontente de ter visto a Air France perder esta aquisição para o grupo alemão. Entretanto, o Grupo Air France-KLM investiu na escandinava SAS, adquirindo em bolsa uma posição minoritária significativa, mas a companhia continua “ligada à máquina” e dependente da generosidade dos credores para sobreviver. A atual Comissão Europeia tem dificultado a consolidação do setor no Continente e a aquisição da TAP virá, cronologicamente, a seguir a estes dossiers pendentes. Caso avancem, a aquisição da TAP poderá não ter um caminho mais difícil. Por outro lado, as eleições europeias de junho poderão mudar este entendimento e dar lugar a uma nova Comissão que dê maior primazia ao posicionamento concorrencial das companhias europeias à escala global, em detrimento de uma visão intraeuropeia. Ainda no cenário externo, deveremos acrescentar a intervenção das autoridades da concorrência dos Estados Unidos e do Canadá e, no caso da TAP, certamente do Brasil, também.
Torna-se muito difícil tecer prognósticos, tão díspares são os cenários políticos possíveis – em Portugal e na Europa. O destino das companhias Air Europa, ITA Airways e SAS, todas elas com soluções de aquisição pendentes de aprovação política e/ou de validação económica, também terão uma influência determinante no processo da TAP. Neste momento, a minha única certeza é que a TAP continuará pública até, pelo menos, 2026. “Habituem-se”!
Por Pedro Castro
É diretor da SkyExpert