Quinta-feira, Março 20, 2025
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Da hospitalidade dos Jogos Olímpicos à ambição do Turismo Espacial

Os cincos círculos que compõem o símbolo dos Jogos Olímpicos representam a união dos cinco continentes e a fraternidade entre os povos. Realizados ininterruptamente há mais de 125 anos (retomados, na era moderna, em 1896), os Jogos Olímpicos comemoram a excelência, a camaradagem e o espírito desportivo dos atletas. Durante a sua realização, os problemas da humanidade são colocados em perspectiva. Este ano, a cidade de Tóquio é a anfitriã do maior evento desportivo à escala mundial.

Na Grécia Antiga, os Jogos Olímpicos foram fundados na cidade de Olímpia em homenagem a Zeus, e fomentaram o espírito de hospitalidade entre pessoas oriundas de comunidades diferentes, tendo dado origem à palavra ‘Xenia’, que significa ‘hospitalidade’. As raízes desta palavra estão profundamente associadas a Olímpia, pois, no ano 450 a.C., aí foi construído o estabelecimento ‘Leonidio’, a primeira hospedaria criada com a finalidade de alojar os visitantes que quisessem assistir aos eventos desportivos e, em simultâneo, protegê-los de qualquer desconforto resultante da estadia na cidade. Trata-se do primeiro ‘hotel’ de que se tem notícia. Hoje sabemos que os Gregos tiveram um papel importante na consolidação da hospitalidade, oferecendo a quem vinha de fora um lugar para descansar, alimentação, cuidados e banhos, o que explica a presença das instalações balneárias em muitas descobertas arqueológicas.

O sentimento de hospitalidade está também associado à segurança. O ser humano sempre precisou de se abrigar como forma de se proteger das intempéries e dos animais selvagens. Mesmo em contexto nómada, o abrigo sempre suportou a mobilidade. Desde tempos imemoriais que o ser humano sente vontade de explorar o desconhecido, esgravatando território subterrâneo e imaginando experiências debaixo do mar. Exemplo disto mesmo é o Poseidon Under Sea Resorts, um projeto hoteleiro nas Ilhas Fiji, que nasce debaixo do mar, sendo que o restaurante Al Mahara do Hotel Burj Al Arab, no Dubai, já serve refeições em profundidades semelhantes.

A exploração do espaço também faz parte do sonho de muitos de nós, sendo já uma realidade próxima para alguns. Passou meio século desde que o Homem pisou a Lua. No dia 20 de Julho de 1969, o mundo parou em frente à televisão e houve quem achasse que todo aquele cenário era uma encenação. Volvidos mais de 50 anos, começam as tentativas para comercializar a experiência espacial. Hoje existem multimilionários a digladiar entre si atenções e a ver quem chega mais longe. Sir Richard Branson, dono da empresa VirginGalatic, fez a primeira viagem espacial comercial que durou cerca de 90 minutos e foi o primeiro voo tripulado de uma companhia de turismo espacial. Por sua vez, Jeff Bezzos, o fundador da Amazon, foi ao espaço em voo tripulado, sem piloto. A Nasa contratou a SpaceX de Elon Musk para uma missão a Júpiter. Simultaneamente, já se negoceiam espaços para construir hotéis ou colónias flutuantes no espaço, que, segundo Bezzos, abrigarão os futuros hóspedes. A história ensinou que a evolução da hotelaria ocorre paralelamente à dos transportes, como aconteceu com a generalização das linhas férreas ou a utilização comercial dos aviões, que criaram rotas aéreas para o transporte de um grande número de passageiros para destinos cada vez mais longínquos. Nos primórdios do século XIX, os comboios desempenharam um papel importante na mobilidade das pessoas, levaram-nas aos mais distantes lugares, mas, concomitantemente, foi necessário construir alojamento onde pudessem pernoitar. Agora a diferença é que falamos de transportes espaciais.

Branson, Bezzos e Musk foram atrás dos seus sonhos. Vão encontrar forma de outros fazerem o mesmo e daqui a uns anos (poucos, pelo andar da carruagem), serão necessários hotéis na Lua e noutros locais siderais para os hóspedes espaciais pernoitarem. E daqui a mais umas décadas, estabelecido o destino, começarão a surgir outras preocupações, como as do desenvolvimento sustentável do destino, da criação de experiências autênticas para os hóspedes e eventualmente outras relacionadas com o overtourism. E novos termos se juntarão ao vocabulário do Turismo, como turismo espacial, hotéis espaciais, spaceports (aeroportos espaciais) e agências de viagens espaciais.

E para que a magia aconteça, nem precisamos de varinha. O preço de um bilhete custa cerca de 200 mil dólares e uns quantos testes de aptidão física e psicológica para a viagem.

Mais anos se seguirão até que as viagens ao espaço se transformem numa commodity, e nessa altura, quiçá, os Jogos Olímpicos serão disputados entre terrestres e afins.

Se dúvidas houvesse sobre a versatilidade e a empregabilidade dos gestores hoteleiros, elas aqui ficam dissipadas, pois na falta de emprego e trabalho no planeta Terra, o céu não é o limite….

“Hospitality converts strangers into familiars, enemies into friends,
friends into better friends, outsiders into insiders, non-kin into kin”

(Lashley & Morrison, 2000, p.19)

Por Sofia Almeida

É professora na Universidade Europeia e investigadora no CEG/Territur, Universidade de Lisboa.
salmeida@universidadeeuropeia.pt

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